Não tenho muitas lebranças dele, alguns fragmentos de
diálogos quase sempre conduzidos pela sua voz pastosa de alcool, algumas cenas
mais marcantes de brigas e discussões, e principalmente seu olhar de uma
expressão enigmática que se mostrava distante e ao mesmo tempo penetrante, se é
que isso faz sentido.
Minha infância foi quase que totalmente apagada da memória,
por fome, por vergonha, ou por defesa do organismo que tenta eliminar tudo que
é nocivo, quem sabe.
A adolescência foi dividida entre o tempo que passei matando
o tempo e o tempo em que vivia com a mente obscurecida por substâncias tóxicas.
Momentos ainda que mergulhado na vertiginosa fantasia esperançosa de que tudo fosse diferente, ou que apenas
chegasse ao fim.
Envelheci rápido demais para perceber que a maturidade não
acompanhava meus passos largos rumo à consciência de que estava perdido, e me
parecia demais com ele, por isso estava fadado ao mesmo fim.
Tenho a impressão que tudo que lembro são os erros, nada de
que pudesse me orgulhar ou contar aos amigos, tudo era tristeza e pesar. Ouvi
muitas histórias a seu respeito, mas nunca conheci este homem de que falavam.
Demorei tanto tempo para descobrir que eu não era ele e
tomar conhecimento de mim mesmo, que sinto que vivi pouquíssimos anos apesar da
meia idade. Me encontrar foi um alívio, agora meu caminho seria outro, e
durante esta nova caminhada poderia observar os passos dele com mais clareza.
Agora compreendo,
pois não tenho o pensamento turvo, mas não me lembro dele como gostaria. Não
que eu não queira, mas talvez, porque ele não fez nada que eu pudesse recordar com
alegria...
Se esses momentos existiram, talvez eu lembre um dia...
Darim Junior
