- Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
- Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
- E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
- Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
- Indesculpavelmente sujo,
- Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
- Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
- Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
- Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
- Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
- Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
- Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
- Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
- Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
- Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
- Para fora da possibilidade do soco;
- Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
- Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
- Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
- Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
- Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
- Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
- Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
- Que contasse, não uma violência, mas uma covardia!
- Não, são todos o Ideal, se os ouço e me falam.
- Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
- Ó príncipes, meus irmãos,
- Arre, estou farto de semideuses!
- Onde é que há gente no mundo?
- Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
- Poderão as mulheres não os terem amado,
- Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
- E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
- Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
- Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
- Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
- Álvaro de Campos: (pseudônimo)
- O externauta também procura um humano...
- e você, conhece algum?
sábado, 16 de abril de 2011
POEMA EM LINHA RETA
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