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domingo, 19 de abril de 2015

Mineirice

Algumas pessoas ainda não entenderam minha opção por me radicar em Minas, isso mesmo, radicar em Minas; mas confesso que aqui as coisas são muito mais do que parecem.

Paixão, amor, apaixonado, carinhoConfesso que tenho alguns dos piores defeitos em uma pessoa, um exemplo disso são os 3 Ps que carrego desde a infância: Sou Paulista, Pobre e Palmeirense! Mas tenho qualidades também; e uma delas é apreciar a beleza onde quer que ela esteja, sem preconceito, sem ressalvas ou medo de apaixonar-se. Eu mesmo já postei algumas piadas sobre este estado maravilhoso, mas é só brincadeira, todos sabem disso.

É isto que Minas Gerias representa para os afortunados que dela usufruem, uma paixão avassaladora que contrasta com o ritmo mineiro de ser.

Uma amiga (Elaine) postou um vídeo no Face que demonstra uma destas armas secretas escondidas nos mais remotos vilarejos daqui, e nas grandes cidades também, porque Minas é "grande com força". Trata-se de um texto Carlos Drummond de Andrade em uma adaptação de Felipe Peixoto Braga Netto. Não resisti, posto aqui o texto e o vídeo... mas cuidado: "Pode ser prejudicial à sua saúde física, mental e emocional."


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O Sotaque das Mineiras

O sotaque das mineiras deveria ser ilegal, imoral ou engordar. Porque, se tudo que é bom tem um desses horríveis efeitos colaterais, como é que o falar lindo (das mineiras) ficou de fora?

Mineira deveria nascer com tarja preta avisando: ouvi-la faz mal à saúde. Se uma mineira, falando mansinho, me pedir para assinar um contrato doando tudo que tenho, sou capaz de perguntar: só isso? Assino achando que ela me faz um favor.

Eu sou suspeitíssimo. Confesso: esse sotaque me desarma. Os mineiros têm um ódio mortal das palavras completas. Preferem abandoná-las no meio do caminho, não dizem: pode parar, dizem: 'pó parar'. Não dizem: onde eu estou?, dizem: 'ôncôtô'. Os não-mineiros, ignorantes nas coisas de Minas, supõem, precipitada e levianamente, que os mineiros vivem lingüisticamente falando, apenas de uais, trens e sôs. 

Digo-lhes que não(...) 

Mineiras não usam o famosíssimo 'tudo bem'. Sempre que duas mineiras se encontram, uma delas há de perguntar pra outra: - 'Cê tá boa?'. Para mim, isso é pleonasmo. Perguntar para uma mineira se ela tá boa é desnecessário. 

Há outras. (...) 

- 'Aqui', não vou dar conta de chegar na hora, não. Esse 'aqui' é outro que só tem aqui(...) Que os mineiros não acabam as palavras, todo mundo sabe. É um tal de 'bonitim', 'fechadim', e por aí vai. Já me acostumei a ouvir: - E aí, 'vão?'. Traduzo: - E aí, vamos? Não caia na besteira de esperar um 'vamos' completo de uma mineira. Não ouvirá nunca.
 
 Eu preciso avisar à língua portuguesa que gosto muito dela, mas prefiro, com todo respeito, a mineira. Nada pessoal. Aqui certas regras não entram. São barradas pelas montanhas.
 
Por exemplo, em Minas, se você quiser falar que precisa ir a um lugar, vai dizer: - Eu preciso 'de' ir. Onde os mineiros arrumaram esse 'de', aí no meio, é uma boa pergunta. Só não me perguntem. Mas que ele existe, existe(...)
 
Aqui em Minas ninguém precisa ir a lugar nenhum. Entendam... Você não precisa ir, você precisa 'de' ir. Você não precisa viajar, você precisa 'de' viajar. Se você chamar sua filha para acompanhá-la ao supermercado, ela reclamará: - Ah, mãe, eu preciso 'de' ir? No supermercado, o mineiro não faz muitas compras, ele compra um 'tanto de coisa'. O supermercado não estará lotado, ele terá um 'tanto de gente'(...) Entendeu? 

Se, saindo do supermercado, a mineirinha vir um mendigo e ficar com pena, suspirará: - 'Ai, gente, que dó'.
É provável que a essa altura o leitor já esteja apaixonado pelas mineiras(...) Para uma mineira falar que algo é muitíssimo bom vai dizer: - 'Ô, é sem noção'. Entendeu?
 
É 'sem noção! ' Só não esqueça, por favor, o 'Ô' no começo, porque sem ele não dá para dar noção do tanto que algo é sem noção, entendeu?
 
 Capaz... Se você propõe algo ela diz: - 'Capaz'!!! Vocês já ouviram esse 'capaz'? É lindo(...) Já ouviu o 'nem...? ' Completo ele fica: - Ah, 'nem' (...)

A propósito, um mineiro não pergunta: - Você não vai? A pergunta, mineiramente falando, seria: - 'Cê' não anima 'de' ir? Tão simples. O resto do Brasil complica tudo. É, ué, cês dão umas volta pra falar os trem(...) 

O plural, então, é um problema. Um lindo problema, mas um problema. Sou, não nego, suspeito. Minha inclinação é para perdoar, com louvor, os deslizes vocabulares das mineiras. Aliás, deslizes nada. Só porque aqui a língua é outra, não quer dizer que a oficial esteja com a razão. Se você, em conversa, falar: - Ah, fui lá comprar umas coisas... - 'Que' s coisa?' - ela retrucará. O plural dá um pulo(...) E se você acusar injustamente uma mineira, ela, chorosa,confidenciará: - Ele pôs a culpa 'ni mim'. A conjugação dos verbos tem lá seus mistérios, em Minas. 

Ontem, uma senhora docemente me consolou: 'preocupa não, bobo!'. E meus ouvidos, já acostumados às ingênuas conjugações mineiras, nem se espantam. Talvez se espantassem se ouvissem um: 'não se preocupe', ou algo assim. 

A fórmula mineira é sintética. E diz tudo. Até o tchau, em Minas, é personalizado. Ninguém diz tchau pura e simplesmente. Aqui se diz: 'tchau pro cê', 'tchau pro cês'. É útil deixar claro o destinatário do tchau.

Então neh, as mineiras são trem bão demais sô....

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O vídeo foi gravado por Ellen Matos em sua página no YouTube 

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Resista se Puder






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